terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

da Teoria da Deriva

Entre os diversos procedimentos situacionistas, a deriva se apresenta como uma técnica de passagem rápida por ambiências variadas. O conceito de deriva está indissoluvelmente ligado ao reconhecimento de efeitos de natureza psicogeográfica e à afirmação de um comportamento lúdico-construtivo, o que o torna absolutamente oposto às tradicionais noções de viagens e de passeio.

Uma ou várias pessoas que se dediquem à deriva estão rejeitando, por um período mais ou menos longo, os motivos de se deslocar e agir que costumam ter com os amigos, no trabalho e no lazer, para entregar-se às solicitações do terreno e das pessoas que venham a encontrar. A parte aleatória não é tão determinante quanto se imagina, mas em sua unidade, a deriva contém ao mesmo tempo esse deixar-se levar e sua contradição necessária.

O acaso ainda tem importante papel na deriva porque a observação psicogeográfica não está ao todo consolidada. Mas a ação do acaso é naturalmente conservadora e tende, num novo contexto, a reduzir tudo à alternância de um número limitado de variantes e ao hábito.

O caráter principalmente urbano da deriva, no contato com centros de possibilidade e de significações que são as grandes cidades transformadas pela indústria, procura responder à frase de Marx: "Os homens não vêem nada em torno de si que não seja o próprio rosto, tudo lhes fala deles mesmos. Até a paisagem é algo vivo."

As lições da deriva permitem estabelecer os primeiros levantamentos das articulações psicogeográficas de uma cidade moderna. Além do reconhecimento de unidades de ambiência, de seus componentes fundamentais e de sua localização espacial, percebem-se os principais eixos de passagem, as saídas e as defesas. Medem-se as distâncias que separam de fato duas regiões de uma cidade, distâncias bem diferentes da visão aproximativa que um mapa pode oferecer.

As diferentes unidades da atmosfera e de moradia não são hoje em dia muito nítidas, e sim cercadas de margens fronteiriças mais ou menos extensas. A mudança mais geral que a deriva leva a propor, é a diminuição constante dessas margens até sua completa supressão.

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